A época atual vangloria-se de que nunca antes os homens possuíram tantas facilidades para a obtenção de conhecimento ou manifestaram um interesse tão geral pela educação. A despeito, porém, desse alardeante progresso, existe um espírito de insubordinação e temeridade sem paralelo na nova geração; a degeneração mental e moral é quase universal. A educação popular não corrige o mal. A frouxa disciplina em muitas instituições de ensino quase tem destruído sua utilidade, tornando-as, nalguns casos, uma maldição, e não uma bênção. Este fato tem sido visto e deplorado, e estão sendo feito diligentes esforços para corrigir as falhas em nosso sistema educacional. Há urgente necessidade de escolas em que os jovens possam adquirir hábitos do domínio próprio, aplicação e confiança em si mesmos, de respeito para com os superiores e de reverência para com Deus. Com tal instrução, poderemos esperar ver os jovens preparados para honrar o seu Criador e ser uma bênção para os semelhantes.
Foi para conseguir tais objetivos que se fundou o nosso Colégio de Battle Creek. Os que procuram, porém, realizar semelhante obra verificam que seu cometimento está repleto de numerosas e graves dificuldades. O mal que constitui a base de todos os outros e que freqüentemente neutraliza os esforços dos melhores professores, encontra-se na disciplina do lar. Os pais não discernem a importância de proteger os filhos contra as sedutoras tentações desta época. Eles mesmos não exercem o devido controle, e não apreciam, portanto, corretamente o seu valor.
Muitos pais e mães erram por deixarem de apoiar os esforços do fiel professor. Os jovens e as crianças, com sua compreensão imperfeita e juízo não desenvolvido, nem sempre conseguem entender todos os planos e métodos do professor. No entanto, quando transmitem em casa informações sobre o que é dito e feito na escola, são elas debatidas pelos pais no círculo familiar, e o procedimento do professor é criticado sem restrição.
Aqui os filhos aprendem lições que não são esquecidas com facilidade. Todas as vezes que estiverem sujeitos a restrições fora do comum ou tiverem de aplicar-se a penoso estudo, apelarão a seus pais imprudentes por simpatia e condescendência. Deste modo é incentivado um espírito de inquietação e descontentamento, a escola como um todo sofre em resultado da influência desmoralizadora, e o fardo do professor torna-se muito mais pesado. A maior perda, porém, é experimentada pelas vítimas desse desgoverno dos pais. Defeitos de caráter que o devido ensino teria corrigido, são deixados a fortalecer-se com os anos, para danificar e talvez destruir a utilidade de seu possuidor.
Por via de regra, verifica-se que os estudantes mais propensos a queixar-se da disciplina escolar, são os que receberam uma educação superficial. Jamais tendo aprendido a necessidade de inteireza, encaram-na com desagrado. Os pais têm negligenciado instruir seus filhos e filhas para o fiel desempenho dos deveres domésticos. Permite-se que as crianças passem o tempo brincando, enquanto o pai e a mãe labutam incessantemente. Poucos jovens sentem que é seu dever arcar com uma parte dos encargos da família. Não lhes é ensinado que a condescendência com o apetite ou a busca de comodidade ou prazer não constituem o principal objetivo da vida.
O círculo familiar é a escola em que a criança recebe suas primeiras e mais duradouras lições. Por isso devem os pais demorar-se mais no lar. Por preceito e exemplo devem ensinar aos filhos o amor e o temor de Deus; devem ensinar-lhes a ser compreensivos, sociáveis, afetivos; a cultivar hábitos industriosos, de economia e abnegação. Dando aos filhos amor, simpatia e encorajamento no lar, os pais podem prover-lhes um seguro e aprazível refúgio contra muitas tentações do mundo.
"Falta tempo", diz o pai; "não tenho tempo de dedicar-me à instrução de meus filhos; não tenho tempo de dedicar-me a prazeres sociais domésticos." Então não devíeis ter tomado sobre vós a responsabilidade de uma família. Privando-os do
tempo que lhes pertence por direito, estais lhes roubando a educação que deviam receber de vossas mãos. Se tendes filhos, tendes uma obra a fazer, em união com a mãe, na formação do caráter deles. Os que julgam ter a imperativa obrigação de labutar em favor do melhoramento da sociedade, enquanto seus próprios filhos crescem indisciplinados, deveriam verificar se não se equivocaram quanto a seu dever. Sua própria família é o primeiro campo missionário em que os pais devem labutar. Os que abandonam o jardim do lar para que nele cresçam espinhos e cardos, enquanto manifestam grande interesse no cultivo do terreno do vizinho, estão desprezando a Palavra de Deus.
Repito: É a falta de amor e piedade, e a negligência de adequada disciplina no lar que suscitam tanta dificuldade nas escolas e nos colégios. Há um pavoroso estado de indiferença e apatia entre professos cristãos. Eles são insensíveis, descaridosos, implacáveis. Estes maus traços, primeiro tolerados em casa, exercem sua perniciosa influência em todas as relações da vida diária. Se o espírito de bondade e cortesia fosse acalentado por pais e filhos, seria visto também na relação entre o professor e o aluno. Cristo deve ser um hóspede honrado no círculo familiar, e Sua presença não é menos necessária na sala de aula. Oxalá o poder convertedor de Deus abrande e suavize o coração de pais e filhos, professores e estudantes, e o transforme à semelhança de Cristo.
Pais e mães devem estudar o caráter dos filhos com diligência e oração. Devem procurar reprimir e conter os traços demasiado salientes, e estimular outros que sejam deficientes, assegurando assim um desenvolvimento harmonioso. Isto não é uma questão de pouca importância. O pai talvez não considere um grande pecado negligenciar o preparo de seus filhos; mas é assim que Deus o considera. Os pais cristãos necessitam de cabal conversão a esse respeito. A culpa se acumula sobre eles, e as conseqüências de suas ações passam
de seus próprios filhos para os filhos destes últimos. A mente mal-equilibrada, o temperamento precipitado, o mau humor, a inveja, o ciúme testificam da negligência paterna. Esses maus traços de caráter trazem grande infelicidade aos que os possuem. Quantos deixam de receber dos companheiros e amigos o amor que poderiam obter, se fossem mais amáveis! Quantos criam dificuldades onde quer que vão, e em tudo em que se empenham!
Os filhos têm reivindicações que os pais devem reconhecer e respeitar. Eles têm direito a privilégios tais como educação e instrução que os farão membros úteis da sociedade, respeitados e amados aqui, e lhes darão aptidão moral para a sociedade do puro e santo porvir. Aos jovens deve ensinar-se que o seu bem-estar tanto presente como futuro depende em grande medida dos hábitos que formarem na meninice e na juventude. Cedo devem ser acostumados à submissão, à abnegação e ao respeito pela felicidade de outros. Devem ser ensinados a subjugar o temperamento rude, a conter as palavras impulsivas, a manifestar invariável bondade, cortesia e domínio próprio. Pais e mães devem fazer estudo de sua vida que seus filhos possam tornar-se tão perfeitos no caráter quanto o esforço humano combinado com o auxílio divino possa torná-los. Esta obra, com toda a sua importância e responsabilidade, eles aceitaram, desde que trouxeram filhos ao mundo.
Os pais devem fazer com que seu coração e vida sejam controlados pelos preceitos divinos, se desejam criar os seus filhos na disciplina e na admoestação do Senhor. Eles não têm autorização para se irritarem, ralharem e ridicularizarem. Nunca devem escarnecer dos filhos que têm perversos traços de caráter, que eles mesmos lhes transmitiram. Esse modo de disciplina jamais curará o mal. Pais, apresentai os preceitos da Palavra de Deus ao admoestar e reprovar vossos filhos obstinados. Mostrai-lhes um "assim diz o Senhor" como vossa exigência. Uma reprovação que vem como palavra de
Deus, é muito mais eficiente que a que sai em tom áspero e colérico dos lábios dos pais.
Sempre que pareça necessário negar os desejos ou se opor à vontade de uma criança, deve ela ser seriamente impressionada com o pensamento de que isto não é feito para satisfazer os pais, ou para condescender com autoridade arbitrária, mas para o seu bem. Deve ser-lhe ensinado que toda falta não corrigida trar-lhe-á infelicidade e desagradará a Deus. Sob tal disciplina, as crianças encontrarão sua maior alegria em submeter sua vontade à de seu Pai celestial.
Alguns pais - bem como alguns professores - parecem esquecer que eles mesmos já foram crianças. São empertigados, indiferentes e destituídos de simpatia. Onde quer que sejam postos em contato com os jovens - no lar, nas aulas diárias, na Escola Sabatina ou na igreja - mantêm o mesmo ar autoritário, e sua fisionomia encerra habitualmente uma expressão solene e reprovadora. A alegria ou a obstinação infantil, a buliçosa atividade da vida jovem, não encontra desculpa a seus olhos. Pequenas faltas são tratadas como graves pecados. Tal disciplina não é cristã. As crianças assim educadas têm medo dos pais ou dos professores, mas não os amam; não lhes confidenciam suas experiências infantis. Algumas das mais valiosas qualidades da mente e do coração se arrefecem até morrer, como uma tenra planta diante da gélida rajada de vento.
Sorride, pais! Sorride, professores! Se vosso coração está triste, que vosso rosto não o revele. Deixai que a alegria de um coração amorável e grato refulja no rosto. Saí de vossa fria dignidade, adaptando-vos às necessidades das crianças, fazendo que elas vos amem. Necessitais conquistar-lhes a afeição, se quereis imprimir-lhes no coração as verdades religiosas.
Jesus amava as crianças. Lembrava-Se de que uma vez foi criança, e Sua bondosa fisionomia conquistava as afeições dos pequeninos. Eles gostavam de brincar ao Seu redor, e de acariciar-Lhe o afável rosto com suas mãos inocentes. Quando as mães hebréias trouxeram seus bebês para serem abençoados pelo querido Salvador,
os discípulos julgaram que isso era demasiado insignificante para interromper-Lhe os ensinos. Jesus compreendeu, porém, o ardente anelo do coração dessas mães, e, contendo os Seus discípulos, disse: "Deixai os pequeninos e não os estorveis de vir a Mim, porque dos tais é o reino dos Céus." Mat. 19:14.
Pais, tendes uma obra a fazer por vossos filhos que nenhuma outra pessoa pode realizar. Não podeis lançar vossas responsabilidades sobre os outros. O dever do pai para com seus filhos não pode ser transferido à mãe. Se ela cumpre o seu dever, já tem trabalho bastante. Unicamente trabalhando unidos, podem pai e mãe dar desempenho à tarefa que Deus lhes pôs nas mãos.
Para os pais e os filhos é mais do que perdido o tempo dedicado à aquisição de riquezas, enquanto são negligenciados o aperfeiçoamento mental e a cultura moral. Os tesouros terrenos terão de passar; mas a nobreza de caráter e o valor moral durarão para sempre. Se a obra dos pais for bem realizada, proclamará através da eternidade sua sabedoria e fidelidade. Os que oneram ao máximo sua bolsa e sua perspicácia a fim de prover para os membros de sua família roupas dispendiosas e alimentos requintados, ou para mantê-los em ignorância do trabalho útil, terão como retribuição apenas o orgulho, a inveja, a obstinação e o desrespeito de seus filhos mimados.
Desde a infância é necessário que se erga na vida dos jovens uma firme barreira entre eles e o mundo, para que não sejam afetados por sua influência corrompedora. Os pais precisam exercer crescente vigilância, a fim de que seus filhos não sejam perdidos para Deus. Se se considerasse de tanta importância que os jovens possuíssem um caráter belo, e amável disposição, como se considera importante que imitem as modas do mundo no vestuário e no comportamento, veríamos centenas onde hoje vemos um que vem para o cenário da vida ativa preparado para exercer enobrecedora influência sobre a sociedade.
A obra de educação, instrução e disciplina da parte dos pais constitui a base de todas as outras. Os esforços dos melhores professores muitas vezes terão de produzir pouco
resultado, se os pais e as mães deixam de desempenhar a sua parte com fidelidade. A Palavra de Deus sempre deve ser o seu guia. Não procuramos apresentar outra linha de conduta. Colocamos diante de todos os ensinos dessa Palavra pela qual deve ser julgada a nossa obra, e perguntamos: É este o padrão que nós como pais cristãos estamos procurando atingir? Review and Herald, 21 de março de 1882.