Cristo, no ermo deserto, não Se achava em posição tão favorável para resistir às tentações de Satanás, como Adão quando foi tentado no Éden. O Filho de Deus humilhou-Se e tomou a natureza humana, depois de haver a raça vagueado quatro mil anos fora do Éden e do seu estado original de pureza e retidão. O pecado tinha imposto seus terríveis estigmas ao gênero humano, por séculos; e a degenerescência física, mental e moral prevalecia por toda a família humana.
Quando Adão, no Éden, foi assaltado pelo tentador, estava ele sem a mancha do pecado. Subsistia diante de Deus na força de sua perfeição. Todos os órgãos e faculdades de seu ser achavam-se desenvolvidos uniformemente, equilibrados e harmônicos.
Cristo, no deserto da tentação, ficou no lugar de Adão para suportar a prova a que ele deixou de resistir. Ali Cristo venceu em lugar do pecador, quatro mil anos depois de Adão volver costas à luz de seu lar. Separada da presença de Deus, a família humana, a cada geração sucessiva, estivera se afastando mais e mais, da pureza, sabedoria e conhecimento originais, que Adão possuía no Éden. Cristo suportou os pecados e fraquezas
da raça humana tais como existiam quando Ele veio à Terra para ajudar o homem. Em favor da raça, tendo sobre Si as fraquezas do homem caído, devia Ele resistir às tentações de Satanás em todos os pontos em que o homem seria tentado.
Adão achava-se rodeado de tudo que seu coração pudesse desejar. Supridas estavam todas as suas necessidades. Não havia no glorioso Éden pecado nem sinais de degenerescência. Anjos de Deus se comunicavam livre e amorosamente com o santo par. As felizes aves canoras gorjeavam seus espontâneos e alegres cânticos de louvor ao seu Criador. Os pacíficos animais, em feliz inocência, brincavam em volta de Adão e Eva, obedientes a sua palavra. Adão ali estava na perfeição de sua varonilidade, a mais nobre das obras do Criador. Trazia a imagem de Deus, mas era um pouco abaixo dos anjos.
Cristo Como o Segundo Adão
Em que contraste Se acha o segundo Adão, ao adentrar o sombrio deserto para, sozinho, lutar com Satanás! Desde a queda o gênero humano estivera a decrescer em tamanho e força física, baixando mais e mais na escala do valor moral, até ao período do advento de Cristo à Terra. E para elevar o homem caído, precisava Cristo alcançá-lo onde se achava. Assumiu natureza humana e arcou com as fraquezas e degenerescência da raça. Ele, que não conhecia pecado, tornou-Se pecado por nós. Humilhou-Se até às mais baixas profundezas da miséria humana, a fim de que pudesse estar habilitado a alcançar o homem e tirá-lo da degradação na qual o pecado o lançara.
"Convinha que Aquele, para quem são todas as coisas, e mediante quem tudo existe, trazendo muitos filhos à glória, consagrasse pelas aflições o Príncipe da salvação deles." Heb. 2:10.
"Porque não temos um sumo sacerdote que não possa compadecer-se das nossas fraquezas; porém Um que, como nós, em tudo foi tentado, mas sem pecado." Heb. 4:15.
Satanás estivera em guerra contra o governo de Deus, desde quando se rebelara, no princípio. Seu êxito ao tentar Adão e Eva no Éden e introduzir no mundo o pecado, tornara ousado esse arquiinimigo e ele se jactara orgulhosamente perante os anjos celestes de que, quando Cristo aparecesse, assumindo a
natureza humana, seria mais fraco do que ele, e O levaria de vencida pelo seu poder. Exultou com o pensamento de que Adão e Eva, no Éden, não puderam resistir a suas insinuações, quando ele apelou para o apetite. Os habitantes do mundo antigo venceu ele da mesma forma, por meio da condescendência com o apetite concupiscente e paixões corruptas. Pela satisfação do apetite vencera os israelitas. Jactava-se de que o próprio Filho de Deus, que esteve com Moisés e Josué, não resistira ao seu poder, não conseguindo levar até Canaã o favorecido povo de Sua escolha; pois quase todos os que saíram do Egito, morreram no deserto. Também o manso Moisés, tentara ele a atribuir a si a glória reivindicada por Deus. Davi e Salomão, que tinham sido especialmente favorecidos por Deus, induzira ele a incorrer no desagrado divino, mediante a condescendência com o apetite e a paixão. E jactava-se de que teria ainda êxito em desfazer o propósito divino da salvação do homem por Jesus Cristo.
No deserto da tentação Cristo ficou sem alimento por quarenta dias. Moisés, em ocasiões especiais, estivera o mesmo período sem alimento. Não sentira, porém, o tormento da fome. Não fora tentado nem molestado por um inimigo vil e poderoso, como o foi o Filho de Deus. Fora erguido acima do humano, sustido especialmente pela glória de Deus, a qual o envolvia.
Terríveis Efeitos do Pecado Sobre o Homem
Satanás tivera tão grande êxito em enganar os anjos de Deus, e na queda do nobre Adão, que pensava que na humilhação de Cristo ele teria êxito em vencê-Lo. Considerava com prazerosa exultação o resultado das tentações e o aumento do pecado na contínua transgressão da lei de Deus por mais de quatro mil anos. Tinha operado a ruína de nossos primeiros pais e trazido ao mundo pecado e morte, levando à destruição multidões de todos os séculos, países e classes. Por seu poder controlara cidades e nações até que seu pecado provocasse a ira de Deus para destruí-los por fogo, água, terremotos, espada, fome e pestilência. Por sua sutileza e seus esforços incansáveis
controlara ele o apetite e despertara e fortalecera as paixões tão tremendamente que desfigurara e quase obliterara a imagem de Deus no homem. A dignidade física e moral deste foi destruída em tão alto grau, que ele trazia apenas uma pálida semelhança com o dignificado Adão no Éden, quanto ao caráter e à nobre perfeição das formas.
Por ocasião do primeiro advento de Cristo, Satanás havia derribado o homem de sua original e exaltada pureza, maculando com o pecado o fino ouro. Transformara o homem, criado para ser um soberano no Éden, em escravo na Terra, gemendo sob a maldição do pecado. O halo de glória, que Deus dera ao santo Adão, e que o cobria como um vestido, deixou-o após a sua transgressão. A luz da glória de Deus não podia cobrir a desobediência e o pecado. Em lugar da saúde e da plenitude de bênçãos, a pobreza, doença e sofrimento de toda sorte deviam ser a porção dos filhos de Adão.
Satanás, por seu poder sedutor, levara os homens, mediante vãs filosofias, a pôr em dúvida a revelação divina e a existência de Deus e mesmo a descrer delas afinal. Podia ele olhar em volta, a um mundo de miséria moral e uma raça exposta à ira de um Deus que pune o pecado, com perverso triunfo por haver tido tanto êxito em obscurecer a vereda de tantos, levando-os a transgredir a lei de Deus. Revestiu o pecado de roupagens atraentes, a fim de conseguir a ruína de muitos.
Mas seu esquema de maior êxito em enganar o homem tem consistido em ocultar seus propósitos verdadeiros e seu caráter real, apresentando-se como amigo do homem e benfeitor do gênero humano. Lisonjeia os homens com a aprazível fábula de que não existe um inimigo rebelde, nenhum mortal antagonista contra o qual se devessem precaver, e que a existência de um diabo pessoal é inteira ficção. Enquanto assim oculta sua existência, arregimenta ele milhares para debaixo de seu controle. Ilude-os, como tentou enganar a Cristo, dizendo-se anjo do Céu, fazendo uma boa obra em favor da humanidade. E as massas por tal forma ficam cegadas ao pecado, que não conseguem discernir as estratégias de Satanás, e honram-no como honrariam a um anjo celestial, enquanto ele opera a sua ruína eterna.