Em minha segunda visão, cerca de uma semana depois da primeira, o Senhor me apresentou uma perspectiva das provas por que eu iria passar, e disse-me que eu deveria ir relatar a outros o que Ele me havia revelado. Foi-me mostrado que meus trabalhos encontrariam grande oposição, e meu coração seria ferido pela angústia; mas a graça de Deus seria suficiente para amparar-me em tudo.
Depois que voltei dessa visão, fiquei imensamente perturbada, pois ela indicava o meu dever de ir entre o povo e apresentar a verdade. Eu tinha a saúde tão debilitada que constantemente me encontrava em sofrimento físico, e pelas aparências, não tinha senão pouco tempo de vida. Eu tinha, então, apenas dezessete anos de idade, era pequena e franzina, não acostumada à sociedade, e naturalmente tão tímida e reservada que era penoso para mim enfrentar estranhos.
Durante vários dias e até tarde da noite, orei para que este encargo fosse removido de mim e posto sobre alguém mais capaz de o suportar. Não se me alterou, porém, a consciência do dever, e soavam-se continuamente aos ouvidos as palavras do anjo: "Toma conhecido a outros o que te revelei."
Até então, quando o Espírito de Deus comigo instava a respeito do meu dever, eu me dominava, esquecendo todo receio e timidez, pelo pensamento do amor de Jesus e da obra maravilhosa que Ele por mim fizera.
Parecia-me, porém, impossível realizar esse trabalho que me era apresentado. Achava que, se tentasse, seria fracasso certo. As provações que o acompanhariam me aparentavam ser mais do que poderia suportar. Como poderia eu, ainda tão jovem, sair de um lugar para outro, para explicar ao povo as santas verdades de Deus? Meu coração estremecia de terror
àquele pensamento. Meu irmão Roberto, apenas dois anos mais velho do que eu, não poderia acompanhar-me, pois era de saúde fraca, e sua timidez maior do que a minha; nada o poderia induzir a dar semelhante passo. Meu pai tinha a família para sustentar e não poderia abandonar suas ocupações; mas repetidas vezes me afirmava que se Deus me havia chamado para trabalhar noutros lugares, não deixaria de abrir o caminho para mim. Mas essas palavras de animação pouco conforto traziam ao meu desalentado coração; o caminho diante de mim parecia obstruído com dificuldades que eu era incapaz de superar.
Eu desejava a morte como livramento das responsabilidades que sobre mim convergiam. Finalmente a doce paz que havia tanto tempo eu sentia, deixou-me, e o desespero novamente me oprimia a alma.
Animação Recebida dos Irmãos
O grupo de crentes de Portland ignorava a preocupação de espírito que me prostrara nesse estado de desânimo; mas sabiam que por qualquer razão eu estava abatida e, considerando a maneira misericordiosa como o Senhor Se manifestara a mim, opinavam que esse meu desalento era pecaminoso. Realizavam-se reuniões em casa de meu pai, mas tão grande era a minha angústia de espírito, que a elas não assisti por algum tempo. Meu fardo tornava-se mais e mais pesado, até que minha agonia de espírito parecia ser superior às minhas forças.
Finalmente fui induzida a comparecer a uma das reuniões em minha própria casa. A igreja fez de meu caso um assunto especial de oração. O irmão Pearson que se opusera às manifestações do poder de Deus sobre mim nas minhas primeiras experiências, orava agora fervorosamente por mim e me aconselhava a submeter-me à vontade do Senhor.
Como um pai carinhoso procurava animar-me e consolar-me, convidando-me a crer que não fora esquecida pelo Amigo dos pecadores.
Eu me sentia demasiadamente fraca e desanimada para fazer por mim mesma qualquer esforço especial; mas meu coração se unia às petições de meus amigos. Agora eu pouco me incomodava com a oposição do mundo, e sentia-me disposta a fazer qualquer sacrifício, se tão-somente pudesse reaver o favor de Deus.
Enquanto se fazia oração por mim, para que o Senhor me desse força e ânimo para levar a mensagem, dissiparam-se as densas trevas que me haviam rodeado, e uma súbita luz veio sobre mim. Alguma coisa que me pareceu semelhante a uma bola de fogo, bateu-me exatamente sobre o coração, e caí ao chão, desfalecida. Pareceu-me estar na presença dos anjos. Um destes seres santos, de novo repetiu as palavras: "Torna conhecido a outros o que te revelei."
O irmão Pearson, que não podia ajoelhar-se por causa de seu reumatismo, testemunhou essa ocorrência. Quando me reanimei suficientemente para ver e ouvir, ele se levantou de sua cadeira e disse: "Vi uma cena tal como jamais esperaria ver. Uma bola de fogo desceu do céu e bateu na irmã Ellen Harmon exatamente sobre o coração. Eu vi! eu vi! Nunca o esquecerei. Isso transformou todo o meu ser. Irmã Ellen, tenha ânimo no Senhor. Desde esta noite nunca mais duvidarei. Doravante nós a ajudaremos, e não a desanimaremos."
O Receio da Exaltação Própria
Oprimia-me o grande receio de que, se eu obedecesse ao chamado do dever e fosse declarar-me favorecida do Altíssimo com visões e revelações para o povo, pudesse entregar-me à
exaltação pecaminosa, e elevar-me acima da posição que me cumpria ocupar, bem como trazer sobre mim o desagrado de Deus e perder a própria alma. Eu sabia de casos tais, e meu coração confrangia-se ante a severa prova.
Supliquei então que, se eu devesse ir relatar o que o Senhor me mostrara, fosse preservada de exaltação. Disse o anjo: "Tuas orações são ouvidas e serão atendidas. Se esse mal que receias te ameaçar, a mão de Deus estará estendida para salvar-te; por meio de aflições Ele te trará a Si, e preservará tua humildade. Apresenta a mensagem fielmente; resiste até ao fim, e comerás do fruto da árvore da vida e beberás da água da vida."
Depois de readquirir consciência das coisas terrestres, entreguei-me ao Senhor, pronta para cumprir Sua ordem, fosse qual fosse.
Entre os Crentes do Maine
Depois de não muito tempo o Senhor abriu o caminho para eu ir com meu cunhado visitar minhas irmãs em Portland, quarenta e cinco quilômetros distante de casa. Enquanto estava ali, tive oportunidade de dar meu testemunho. Por três meses eu tivera a garganta e os pulmões tão doentes que apenas podia falar pouco, e isso mesmo em tom baixo e rouco. Nessa ocasião levantava-me em reunião e começava a falar como em cochicho. Continuava assim por uns cinco minutos, quando aquele estado de sensibilidade e obstrução passava, minha voz ficava clara e forte, e eu falava com toda a facilidade e liberdade por quase duas horas. Terminada a minha mensagem, enfraquecia-se-me a voz até que de novo me achasse perante o povo, quando a mesma singular restauração se repetia. Eu sentia uma constante certeza de que estava fazendo a vontade de Deus, e via assinalados resultados acompanhando meus esforços.
Providencialmente o caminho abriu-se para eu ir à parte oriental do Estado do Maine. O irmão Guilherme Jordan, acompanhado de sua irmã, devia ir a negócios a Orrington, e foi-me solicitado ir com eles. Como eu prometera ao Senhor andar no caminho que Ele abrisse diante de mim, não ousei recuar. O Espírito de Deus acompanhou a mensagem que eu levei àquele lugar; corações alegraram-se na verdade, e os desanimados foram consolados, dispondo-se a renovar sua fé.
Em Orrington encontrei o Pastor Tiago White. Ele era conhecido de meus amigos, e estava empenhado no trabalho da salvação de almas.
Também visitei Garland, onde uma grande congregação se reuniu, vinda de vários lugares para ouvir minha mensagem.
Logo depois disso fui a Exeter, pequena aldeia não longe de Garland. Ali senti um pesado fardo, de que não me pude livrar antes que relatasse o que me havia sido mostrado, concernente a algumas pessoas fanáticas que estavam presentes. Declarei que estavam enganadas pensando que eram influenciadas pelo Espírito de Deus. Meu testemunho foi muito desagradável para essas pessoas e para os que com elas simpatizavam.
Em seguida voltei a Portland, tendo dado o testemunho que Deus me confiara, e experimentado Sua aprovação em cada passo.
Uma Oração Atendida
Na primavera de 1845, fiz uma visita a Topsham, Maine. Certa ocasião vários de nós nos reuníramos em casa do irmão Stockbridge Howland. Sua filha mais velha, a Srta. Frances Howland, muitíssimo minha amiga, estava atacada de febre reumática, e sob cuidados médicos. Suas mãos estavam tão terrivelmente inchadas que não se podiam distinguir as juntas. Quando, sentados, falamos de seu caso, o irmão Howland foi
interrogado se tinha fé que sua filha poderia ser curada em resposta à oração. Respondeu que procuraria crer que sim, e imediatamente declarou que cria ser possível.
Ajoelhamo-nos todos em oração fervorosa a Deus em favor dela. Invocamos a promessa: "Pedi, e recebereis." João 16:24. A bênção de Deus acompanhou as nossas orações, e tivemos a certeza de que Deus desejava curar a enferma. Um dos irmãos presentes exclamou: "Há aqui uma irmã que tenha fé para tomá-la pela mão e mandar que, em nome do Senhor, se levante?"
A irmã Frances estava deitada no quarto de cima, e antes que ele acabasse de falar, a irmã Curtis já se dirigia à escada. Entrou no quarto da enferma, com o Espírito de Deus sobre si, e tomando a doente pela mão, disse: "Irmã Frances, em nome do Senhor, levante-se e sare." Nova vida atravessou as veias da jovem enferma, fé santa se apoderou dela e, obedecendo-lhe aos impulsos, levantou-se do leito, ficou em pé, e andou pelo quarto, louvando a Deus pelo seu restabelecimento. Vestiu-se logo, e, com o rosto iluminado de indizível alegria e gratidão, desceu à sala em que estávamos reunidos.
Na manhã seguinte almoçou conosco. Logo depois, enquanto o Pastor White lia o quinto capítulo de Tiago, para o culto familiar, chegou o médico ao vestíbulo, e como de costume subiu as escadas para visitar sua cliente. Não a achando ali, desceu à pressa e, com expressão de espanto, abriu a porta da grande cozinha onde estávamos todos sentados, inclusive sua paciente. Olhou para ela com admiração, e finalmente proferiu: "Então Frances, está melhor!"
O irmão Howland respondeu: "O Senhor a curou", e o que lia reatou a leitura do capítulo, no ponto em que fora interrompida: "Está alguém entre vós doente? Chame os presbíteros da igreja, e orem sobre ele." Tia. 5:14. O médico escutou com expressão curiosa, misto de espanto e incredulidade, meneou a cabeça, e saiu precipitadamente.
No mesmo dia a irmã Frances andou a cavalo quatro quilômetros e meio, voltando para casa à noite; e, posto que estivesse chovendo, não lhe adveio disso mal algum, e continuou melhorando rapidamente. Dentro de poucos dias, a seu pedido, foi levada à água e batizada. Conquanto o tempo e a água estivessem muito frios, não lhe sobreveio nenhum mal por isso e, pelo contrário, desde aquele tempo ficou livre da doença, e desfrutou saúde normal.