O Desejado de Todas as Nações

CAPÍTULO 80

No Sepulcro de José

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IX. Ao Trono do Pai

No Sepulcro de José

Jesus descansou, afinal. Findara o longo dia de vergonha e tortura. Ao introduzirem os derradeiros raios do sol poente o dia do sábado, o Filho de Deus estava em repouso, no sepulcro de José. Concluída Sua obra, as mãos cruzadas em paz, descansava durante as sagradas horas do sábado.

No princípio, o Pai e o Filho repousaram no sábado após Sua obra de criação. Quando "os céus, e a Terra e todo o seu exército foram acabados" (Gên. 2:1), o Criador e todos os seres celestiais se regozijaram na contemplação da gloriosa cena. "As estrelas da alva juntas alegremente cantavam, e todos os filhos de Deus rejubilavam." Jó 38:7. Agora Jesus descansava da obra de redenção; e se bem que houvesse dor entre os que O amavam na Terra, reinou contudo alegria no Céu. Gloriosa era aos olhos dos seres celestiais a perspectiva do futuro. Uma criação restaurada, a raça redimida que, havendo vencido o pecado, nunca mais poderia cair - eis o resultado visto por Deus e os anjos, da obra consumada por Cristo. Com esta cena se acha para sempre ligado o dia em que Jesus descansou. Pois Sua "obra é perfeita" (Deut. 32:4); e "tudo quanto Deus faz durará eternamente". Ecl. 3:14. Quando se der a "restauração de todas as coisas, as quais Deus falou por boca dos Seus santos profetas, desde o princípio do mundo" (Atos 3:21, Trad. Figueiredo), o sábado da criação, o dia


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em que Jesus esteve em repouso no sepulcro de José, será ainda um dia de descanso e regozijo. O Céu e a Terra se unirão em louvor, quando, "desde um sábado até ao outro" (Isa. 66:23), as nações dos salvos se inclinarem em jubiloso culto a Deus e o Cordeiro.

Nos acontecimentos finais do dia da crucifixão, foi dada nova prova de cumprimento da profecia, e novo testemunho da divindade de Cristo. Quando a treva se erguera de sobre a cruz, e o Salvador soltara Seu brado agonizante, ouviu-se imediatamete outra voz, dizendo: "Verdadeiramente este era o Filho de Deus." Luc. 23:47.

Essas palavras não foram murmuradas em segredo. Todos os olhos se volveram a ver de onde provinham. Quem falara? Fora o centurião, o soldado romano. A divina paciência do Salvador, e Sua súbita morte, com o grito de vitória nos lábios, impressionara esse pagão. No ferido, quebrantado corpo pendente da cruz, reconheceu o centurião a figura do Filho de Deus. Não pôde deixar de confessar sua fé. Assim foi novamente dada a prova de que nosso Redentor devia ver o trabalho de Sua alma. No mesmo dia de Sua morte, três homens, diferindo largamente entre si, declaravam sua fé - o que comandava a guarda romana, o que conduzira a cruz do Salvador e o que morrera na cruz, ao Seu lado.

Ao aproximar-se a noite, um silêncio estranho pairou sobre o Calvário. A multidão dispersou-se, e muitos volveram a Jerusalém com espírito bem diverso do que tinham pela manhã. Muitos haviam afluído à crucifixão por curiosidade, e não por ódio para com Cristo. Contudo, acreditavam nas acusações dos sacerdotes e olhavam-nO como malfeitor. Sob um despertamento fora do natural, uniram-se à turba em injuriá-Lo. Quando, porém, a Terra foi envolta em trevas, e se sentiram acusados pela própria consciência, acharam-se culpados de uma grande injustiça. Nenhum gracejo ou riso de escárnio se ouviu em meio daquela terrível escuridão; e, dissipada ela, fizeram o caminho de volta a casa em solene silêncio. Estavam convencidos de que as acusações dos sacerdotes eram falsas, de que Jesus não era nenhum impostor; e algumas semanas mais tarde, quando Pedro pregou no dia de Pentecoste, achavam-se entre os milhares que se converteram a Cristo.

Mas os guias judaicos não se mudaram pelos acontecimentos que haviam presenciado. Não arrefecera seu ódio para com Jesus. A treva que cobria a Terra durante a crucifixão, não era mais densa que a que ainda envolvia o espírito dos sacerdotes e principais. Em Seu nascimento, a estrela conhecera a Cristo e guiara


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os magos à manjedoura onde jazia. As hostes celestiais conheceram-nO e entoaram-Lhe o louvor por sobre as planícies de Belém. Conhecera-Lhe o mar a voz e obedecera a Sua ordem. A doença e a morte reconheceram-Lhe a autoridade, entregando-Lhe sua presa. O Sol O conhecera e, à vista de Sua agonia e morte, ocultara a face luminosa. Conheceram-nO as rochas, e fenderam-se, fragmentando-se ao Seu brado. A Natureza inanimada conhecera a Cristo, e dera testemunho de Sua divindade. Mas os sacerdotes e príncipes de Israel não conheceram o Filho de Deus.

Todavia, esses sacerdotes e príncipes não estavam tranqüilos. Levaram a cabo seu desígnio de matar a Jesus; não experimentavam, no entanto, a sensação da vitória que esperavam. Mesmo na hora de seu aparente triunfo, assaltavam-nos dúvidas quanto ao que viria depois. Ouviram o brado: "Está consumado." João 19:30. "Pai, nas Tuas mãos entrego o Meu espírito." Luc. 23:46. Viram as rochas fenderem-se, sentiram o forte terremoto e estavam desassossegados, inquietos.

Tinham invejado a influência de Cristo para com o povo, enquanto vivo; sentiam o mesmo ainda depois de Ele morto. Temiam mais, muito mais o Cristo morto do que haviam temido o Cristo vivo. Receavam que a atenção do povo fosse atraída ainda para os acontecimentos que acompanhavam a crucifixão. Temiam os resultados da obra daquele dia. Por coisa alguma queriam que Seu corpo permanecesse na cruz, durante o sábado. Este se vinha aproximando, e seria uma violação de sua santidade o ficarem os corpos pendentes da cruz. Assim, servindo-se disso como pretexto, os principais judeus solicitaram de Pilatos que se apressasse a morte das vítimas, e seus corpos fossem tirados antes do pôr-do-sol.

Pilatos tinha tão pouca vontade como eles de que o corpo de Jesus ficasse na cruz. Obtido seu consentimento, quebraram as pernas dos dois ladrões para lhes apressar a morte; mas verificaram estar Jesus já morto. Os rudes soldados abrandaram-se pelo que ouviram e testemunharam de Cristo, e abstiveram-se de Lhe quebrar os membros. Assim, na oferta do Cordeiro de Deus cumpriu-se a lei da páscoa: "Dela nada deixarão até à manhã, e dela não quebrarão osso algum; segundo todo o estatuto da páscoa a celebrarão." Núm. 9:12.

Os sacerdotes e principais surpreenderam-se ao verificar que Jesus já estava morto. A morte pela cruz constituía processo vagaroso;


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difícil era determinar quando cessara a vida. Nunca se ouvira que alguém morrera dentro de seis horas de crucifixão. Os sacerdotes desejavam certificar-se da morte de Jesus, e, por sugestão deles, um soldado atirou uma lança ao lado do Salvador. Da ferida assim feita saíram duas copiosas e distintas correntes, uma de sangue, outra de água. Isso foi observado por todos os espectadores, e João declara a ocorrência de maneira bem positiva. Diz ele: "Um dos soldados Lhe furou o lado com uma lança, e logo saiu sangue e água. E aquele que o viu testificou, e seu testemunho é verdadeiro; e sabe que é verdade o que diz, para que também vós o creiais. Porque isto aconteceu para que se cumprisse a Escritura, que diz: Nenhum dos Seus ossos será quebrado. E outra vez diz a Escritura: Verão Aquele que traspassaram." João 19:34-37.

Depois da ressurreição, os sacerdotes e principais puseram em circulação o boato de que Cristo não morrera na cruz, que apenas desmaiara e revivera posteriormente. Outro boato afirmava que não era um corpo real, de carne e osso, mas a semelhança de um corpo, o que fora posto no sepulcro. A ação dos soldados romanos contesta essas falsidades. Não Lhe quebraram as pernas, porque Ele já estava morto. Para satisfazer os sacerdotes, furaram-Lhe o lado. Não se houvesse já extinguido a vida, e isso teria ocasionado imediatamente a morte.

Não foi, porém, a lança atirada, não foi a dor da crucifixão, que produziu a morte de Jesus. Aquele grito soltado "com grande voz" (Luc. 23:46) no momento da morte, a corrente de sangue e água que Lhe fluiu do lado, demonstravam que Ele morreu pela ruptura do coração. Partiu-se-Lhe o coração pela angústia mental. Foi morto pelo pecado do mundo.

Com a morte de Cristo, pereceram as esperanças dos discípulos. Olhavam-Lhe as cerradas pálpebras e a cabeça pendida, o cabelo empastado de sangue, as mãos e os pés traspassados, e indescritível era a angústia que sentiam. Até ao fim não acreditavam que Ele morresse; mal podiam crer que estivesse realmente morto. Esmagados pela dor, não recordavam Suas palavras, a predizer essa mesma cena. Coisa alguma de quanto dissera lhes dava então conforto. Viam unicamente a cruz e a ensangüentada vítima. O futuro afigurava-se-lhes negro e desesperador. Sua fé em Jesus morrera; nunca, porém, haviam amado tanto a seu Senhor. Nunca Lhe haviam antes assim compreendido o valor, e a necessidade que tinham da presença dEle.

Mesmo morto, o corpo de Cristo era muito precioso aos discípulos. Anelavam fazer-Lhe honroso sepultamento, mas não


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sabiam como o haviam de realizar. O crime que dera lugar à condenação de Cristo era traição ao governo romano, e as pessoas mortas por essa ofensa deviam ser sepultadas num terreno especialmente provido para os criminosos. O discípulo João, e as mulheres da Galiléia, haviam permanecido ao pé da cruz. Não podiam deixar o corpo de seu Senhor nas insensíveis mãos dos soldados, e enterrado num desonrosa sepultura. No entanto, não o podiam impedir. Não lhes era possível obter favores das autoridades judaicas, e nenhuma influência tinham junto de Pilatos.

Nessa emergência, José de Arimatéia e Nicodemos vieram em auxílio dos discípulos. Ambos eram membros do Sinédrio e tinham relações com Pilatos. Ambos ricos e influentes, decidiram que o corpo de Jesus teria sepultamento condigno.

José foi ousadamente a Pilatos e pediu-lhe o corpo de Jesus. Pela primeira vez, ouviu Pilatos que Jesus estava na verdade morto. Contraditórias notícias haviam-lhe chegado aos ouvidos quanto aos acontecimentos concernentes à crucifixão, mas ocultaram-lhe propositalmente a morte de Cristo. Pilatos fora prevenido pelos sacerdotes e principais contra algum engano da parte dos discípulos de Jesus em relação ao Seu corpo. Ouvindo o pedido de José, mandou, portanto, chamar o centurião de serviço junto à cruz, e soube com certeza da morte de Cristo. Dele colheu também a narração das cenas do Calvário, confirmando o testemunho de José.

O pedido de José foi satisfeito. Enquanto João estava aflito quanto ao sepultamento do Mestre, voltou ele com a ordem de Pilatos acerca do corpo de Cristo; e Nicodemos chegou trazendo uma custosa mistura de mirra e aloés, de cerca de cem libras de peso, para Seu embalsamento. Ao mais honrado em Jerusalém, não se poderia haver demonstrado mais respeito na morte. Os discípulos surpreenderam-se de ver esses ricos príncipes tão interessados como eles próprios no sepultamento do Senhor.

Nem José nem Nicodemos haviam aceito abertamente o Salvador enquanto vivera. Sabiam que esse passo os excluiria do Sinédrio, e esperavam protegê-Lo por sua influência nos conselhos. Por algum tempo, pareceu haverem sido bem-sucedidos; mas os astutos sacerdotes, vendo como favoreciam a Cristo, embargaram-lhes os planos. Em sua ausência, fora Jesus condenado e entregue para ser crucificado. Agora, que estava morto, não mais ocultaram sua afeição para com Ele. Enquanto os discípulos temiam mostrar-se abertamente como Seus seguidores, José e


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Nicodemos foram ousadamente em seu auxílio. O concurso desses homens ricos e honrados era muito oportuno. Era-lhes dado fazer pelo Mestre morto o que se tornava impossível aos pobres discípulos; e sua riqueza e influência os protegia, em grande parte, da malignidade dos sacerdotes e principais.

Delicada e reverentemente, removeram eles do madeiro, com as próprias mãos, o corpo de Jesus. Corriam-lhes lágrimas de compaixão, ao contemplarem-Lhe o ferido e lacerado corpo. José possuía um sepulcro novo, talhado numa rocha. Reservava-o para si mesmo, mas ficava próximo do Calvário, e preparou-o então para Jesus. O corpo, com as especiarias trazidas por Nicodemos, foi cuidadosamente envolto num lençol de linho, e o Redentor levado à sepultura. Aí, os três discípulos compuseram-Lhe os mutilados membros, e cruzaram-Lhe as mãos feridas sobre o inanimado peito. As mulheres galiléias foram ver se se fizera tudo quanto se podia fazer pelo corpo sem vida do amado Mestre. Viram então que fora rolada a pesada pedra para a entrada do sepulcro, e o Salvador deixado a repousar. As mulheres foram as últimas ao pé da cruz, e as últimas também a deixar o sepulcro. Enquanto baixavam as sombras da noite, Maria Madalena e as outras Marias demoravam-se ainda em torno do lugar em que descansava o Senhor, derramando lágrimas de dor pela sorte dAquele a quem amavam. "E, voltando elas,... no sábado repousaram, conforme o mandamento." Luc. 23:56.

Aquele seria um inesquecível sábado para os tristes discípulos, e também para os sacerdotes, os príncipes, os escribas e o povo. Ao pôr-do-sol do dia de preparação, soaram as trombetas, anunciando o começo do sábado. A páscoa foi observada como fora por séculos, ao passo que Aquele a quem ela apontava havia sido morto por mãos ímpias e jazia no sepulcro de José. No sábado, os átrios do templo encheram-se de adoradores. O sumo sacerdote, vindo do Gólgota, ali estava, esplendidamente vestido com os trajes sacerdotais. Sacerdotes de alvos turbantes, em plena atividade, cumpriam seus deveres. Mas alguns dos presentes não se achavam tranqüilos, ao oferecer-se pelo pecado o sangue de bezerros e bodes. Não estavam conscientes de que o tipo encontrara o antítipo, de que um infinito sacrifício fora feito pelos pecados do mundo. Não sabiam que não mais havia valor no desempenho do serviço ritual. Mas nunca dantes fora aquela cerimônia testemunhada com tão contraditórios sentimentos. As trombetas e os instrumentos de música, bem como as vozes dos cantores, eram tão altos e claros como de costume. Mas dir-se-ia estar tudo


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possuído de um sentimento de estranheza. Um após outro indagava de um singular acontecimento que ocorrera. Até então o santíssimo fora guardado impenetrável. Mas agora se achava exposto aos olhares de todos. O pesado véu de tapeçaria, feito de puro linho, e belamente trabalhado em ouro, escarlate e púrpura, fora rasgado de alto a baixo. O lugar em que Jeová Se encontrara com o sumo sacerdote, para comunicar Sua glória, o lugar que fora a sagrada câmara de audiência de Deus, jazia aberto a todos os olhos - não mais reconhecido pelo Senhor. Com sombrios pressentimentos ministravam os sacerdotes diante do altar. O haver sido exposto o sagrado mistério do lugar santíssimo os enchia de medo de uma calamidade por vir.

Muitos espíritos ocupavam-se com pensamentos despertados pela cena do Calvário. Da crucifixão à ressurreição, muitos olhos insones estiveram constantemente examinando as profecias, alguns para compreender o inteiro significado da festa que então celebravam, outros para procurar provas de que Jesus não era aquilo que pretendia; outros ainda, corações tristes, buscavam testemunho de que Ele era o verdadeiro Messias. Embora indagassem levados por diferentes motivos, convenceram-se todos da mesma verdade - que se cumprira a profecia nos acontecimentos dos últimos dias, e que o Crucificado era o Redentor do mundo. Muitos que, naquela ocasião, tomaram parte do serviço, nunca mais se uniram aos ritos pascoais. Muitos, mesmo dentre os sacerdotes, ficaram convencidos do verdadeiro caráter de Jesus. Suas pesquisas das profecias não foram em vão, e depois de Sua ressurreição reconheceram-nO como o Filho de Deus.

Nicodemos, ao ver Cristo erguido na cruz, lembrou-se das palavras que Ele proferira à noite, no Monte das Oliveiras: "Como Moisés levantou a serpente no deserto, assim importa que o Filho do homem seja levantado; para que todo aquele que nEle crê não pereça, mas tenha a vida eterna." João 3:14 e 15. Naquele sábado, enquanto Jesus Se achava no sepulcro, Nicodemos teve ensejo de refletir. Uma luz mais clara iluminou-lhe o espírito, e as palavras que Jesus lhe dirigira não continuaram mais um mistério para ele. Sentiu haver perdido muito por não se ter ligado ao Salvador enquanto vivera. Recordou então os acontecimentos do Calvário. A súplica de Cristo por Seus assassinos, e a resposta que dera ao pedido do ladrão moribundo, tocaram a alma do douto membro do conselho. Contemplou de novo o Salvador em Sua agonia; tornou a ouvir o derradeiro grito: "Está consumado" (João 19:30), proferido como palavras de um vencedor. Viu novamente a terra cambaleando, os Céus entenebrecidos, o véu rasgado, as rochas fendidas, e sua fé para sempre se estabeleceu. O mesmo acontecimento


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que destruiu a esperança dos discípulos, convenceu José e Nicodemos da divindade de Jesus. Seus temores foram vencidos pela coragem de uma firme, inabalável fé.

Nunca Cristo atraíra a atenção do povo como agora que jazia no túmulo. Como de costume, levaram os doentes e sofredores para os átrios do templo, indagando: Quem nos pode informar acerca de Jesus de Nazaré? Muitos vieram de longe para encontrar Aquele que curava os enfermos e ressuscitava os mortos. De todos os lados, ouvia-se o clamor: Queremos Cristo, o Médico. Nessa ocasião, examinavam os sacerdotes os suspeitos de lepra. Muitos eram forçados a ouvir seu marido, sua esposa ou filhos serem declarados leprosos, e condenados a sair do abrigo de seu lar e de sob o cuidado dos queridos, para advertir os estranhos com o lamentoso grito: "Imundo! imundo!" As mãos amigas de Jesus de Nazaré, que nunca se recusaram ao toque comunicador de cura ao repugnante leproso, achavam-se cruzadas sobre o próprio peito. Os lábios que lhes respondiam às petições com as confortadoras palavras: "Quero, sê limpo" (Mat. 8:3), estavam agora mudos. Muitos apelavam para os principais dos sacerdotes e os príncipes em busca de simpatia e auxílio, mas em vão. Aparentemente, estavam decididos a ter outra vez entre si o Cristo vivo. Com persistente ansiedade, indagavam por Ele. Não queriam ser mandados embora. Mas eram expulsos dos átrios do templo, e foram postados soldados às portas para deter a multidão que chegava com os doentes e moribundos, solicitando entrada.

Os sofredores que tinham ido para ser curados pelo Salvador, sucumbiam ante a decepção. As ruas estavam cheias de lamentos. Os doentes pereciam à míngua do toque vivificante de Jesus. Médicos eram consultados em vão; não havia eficiência como a dAquele que jazia no túmulo de José.

Os lamentos dos que sofriam levaram a milhares à convicção de que se fora do mundo uma grande luz. Sem Cristo, a Terra era sombra e escuridão. Muitos daqueles cuja voz havia avolumado o grito de "Crucifica-O, crucifica-O" (Luc. 23:21), compreendiam agora a calamidade que lhes sobreviera, e teriam com igual veemência clamado - Dá-nos Jesus! - houvesse Ele estado ainda vivo.

Quando o povo soube que Jesus fora morto pelos sacerdotes, fez indagações quanto a Sua morte. Os pormenores de Seu julgamento foram o mais possível conservados em segredo; mas durante o tempo em que Ele permaneceu no sepulcro Seu nome andava em milhares de lábios, e notícias de Seu irrisório


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julgamento, e da desumanidade dos sacerdotes e principais circulavam por toda parte. Por homens de inteligência foram esses sacerdotes e príncipes convidados a explicar as profecias do Antigo Testamento a respeito do Messias, e enquanto procuravam forjar qualquer falsidade em resposta, ficaram como loucos. As profecias que indicavam os sofrimentos e a morte de Cristo, não podiam explicar, e muitos indagadores se convenceram de que as Escrituras se haviam cumprido.

A vingança que os sacerdotes julgaram seria tão doce, já lhes era amarga. Sabiam que estavam enfrentando a severa censura do povo e que os próprios a quem influenciaram contra Jesus se sentiam agora horrorizados com a vergonhosa obra que haviam feito. Esses sacerdotes procuraram crer que Jesus era enganador; mas em vão. Alguns deles estiveram ao pé da sepultura de Lázaro e viram o morto chamado novamente à vida. Tremeram de temor de que Cristo ressuscitasse por Sua vez, e tornasse a aparecer diante deles. Haviam-nO ouvido declarar que tinha poder para dar Sua vida, e para tornar a tomá-la. Lembravam-se de que dissera: "Derribai este templo, e em três dias o levantarei." João 2:19. Judas declarara-lhes as palavras ditas por Ele aos discípulos, durante a última viagem para Jerusalém: "Eis que vamos para Jerusalém, e o Filho do homem será entregue aos príncipes dos sacerdotes, e aos escribas, e condená-Lo-ão à morte. E O entregarão aos gentios para que dEle escarneçam, e O açoitem e crucifiquem, e ao terceiro dia ressuscitará." Mat. 20:18 e 19. Ao ouvirem essas palavras, zombaram e ridicularizaram. Agora, porém, se lembravam de que até ali se haviam cumprido as predições de Cristo. Afirmara que ressuscitaria ao terceiro dia, e quem poderia dizer que isso também não se cumpriria? Desejavam expulsar esses pensamentos, mas não podiam. Como seu pai, o diabo, creram e tremeram.

Agora, que passara o frenesi do despertamento, a imagem de Cristo, malgrado seu, acudia-lhes sempre ao espírito. Viam-nO sereno e sem um queixume perante os inimigos, sofrendo sem murmurar as zombarias e maus-tratos. Ocorriam-lhes todos os acontecimentos de Seu julgamento e crucifixão, com uma empolgante convicção de que Ele era o Filho de Deus. Pensavam que poderia a qualquer momento apresentar-Se diante deles, o Acusado tornando-se acusador, o Condenado a condenar, o Morto a exigir justiça na morte de Seus assassinos.

Pouco puderam repousar no sábado. Embora não transpusessem


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o limiar de um gentio por temor de contaminação, tiveram no entanto, um conselho quanto ao corpo de Cristo. A morte e o sepulcro deviam guardar Aquele a quem crucificaram. "Reuniram-se os príncipes dos sacerdotes em casa de Pilatos, dizendo: Senhor, lembramo-nos de que aquele enganador, vivendo ainda, disse: Depois de três dias ressuscitarei. Manda pois que o sepulcro seja guardado com segurança até o terceiro dia, não se dê o caso que os Seus discípulos vão de noite, e O furtem, e digam ao povo: Ressuscitou dos mortos; e assim o último erro será pior do que o primeiro. E disse-lhes Pilatos: Tendes a guarda; ide, guardai-O como entenderdes." Mat. 27:62-65.

Os sacerdotes deram ordens para ser guardado o sepulcro. Uma grande pedra fora colocada diante da entrada. Através dessa pedra, puseram cordas, prendendo as extremidades à sólida rocha e selando-as com o selo romano. A pedra não podia ser removida sem quebrar o selo. Uma guarda de cem soldados foi então colocada em volta do sepulcro, para impedir que alguém tentasse contra sua segurança. Os sacerdotes fizeram o que puderam para manter o corpo de Cristo onde fora posto. Foi fechado com tanta segurança em Seu túmulo, como se nele devesse permanecer para sempre.

Assim se aconselhavam e faziam planos fracas criaturas. Mal percebiam esses homicidas a inutilidade de seus esforços. Por seu proceder, no entanto. Deus foi glorificado. Os próprios esforços, feitos para impedir a ressurreição de Cristo, são os mais convincentes argumentos em prová-la. Quanto maior o número de soldados colocados ao redor do sepulcro, tanto mais vigoroso o testemunho de que Ele ressurgira. Centenas de anos antes da morte de Cristo, o Espírito Santo declarara por intermédio do salmista: "Por que se amotinam as gentes, e os povos imaginam coisas vãs? Os reis da Terra se levantam, e os príncipes juntos se mancomunam contra o Senhor e contra o Seu Ungido. ... Aquele que habita no Céu Se rirá; o Senhor zombará deles." Sal. 2:1-4. As guardas e as armas romanas foram impotentes para limitar o Senhor da Vida dentro do túmulo. Aproximava-se a hora de Sua libertação.

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